quinta-feira, fevereiro 19, 2009

Oba, não vou!

Deve ser alguma coisa no meu mapa astral, um encontro acidental de planetas e luas que juntos mexeram os pauzinhos pra que sem mais nem menos eu detestasse carnaval. Pior: fico com vontade de chorar toda vez que escuto aquela marcha fúnebre “foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros, depois morreu”. Eu juro que não é culpa minha, eu defendia os blocos e os tumultos que eles causavam, confeccionava fantasias e passava sem traumas pelos porteiros para ir aos blocos de manhã cedo (e também não tinha trauma na volta) e era capaz até de ficar bêbada na Praça XV.

Até que esse ano alguma maldição me pegou de jeito e eu fiquei de bode: pouco me importa se Zezé e sua cabeleira são bossa-nova ou transviados, menos ainda me perturba se Aurora é sincera e tenho a mais absoluta certeza de que cachaça não é água nem aqui na China. Passei minha lista de possíveis fantasias adiante, aproveitei os útimos dias de liquidação nos shoppings e pretendo frequentar cinemas muito bem refrigerados com meus vestidos novos. Caso algo me acometa na véspera, levanto bandeira branca, tiro minha roupa de bate-bola do armário e caio no samba, encarando Boitatá e Boi Tolo mas tem que ser grave, muito grave, uma conjunção de astros daquelas que faz até Pierrot, esse mala, esquecer Colombina, verdadeiramente uma chata de galochas.

segunda-feira, fevereiro 16, 2009

Madrugada dos mortos

Não é bom sinal quando a pessoa está dentro de uma boate e sente frio, a mão congela e ela tem espaço suficiente na pista pra fazer a coreografia do jazz de 1993.

O que acontece que a partir de uma certa idade a gente desaprende como freqüentar uma “night”? Por que de repente a gente começa a se sentir meio “tio”? Por que, meu deus, da noite pro dia o jogo de pac-man passa a ser muito mais emocionante que qualquer set-list dos djs da pista 2 da Casa da Matriz?

É duro. Você chega na porta do lugar e olha para os adolescentes e têm a absoluta certeza de que não é mais um deles: o seu dress-code está ultrapassado, você tem um ataque de riso quando o segurança pede seu documento e fica com medo de ser barrado por excesso de idade. Certamente o público-alvo não é mais... eu.

Lá dentro piora: um dos seus amigos pergunta pro cara do bar “mas que horas as pessoas costumam chegar?!”, o desespero estampado no rosto. Ele é o mesmo que depois perguntará ao dj “mas vem cá, não vai tocar Madonna não?”. Teremos sorte se o Dj tiver nascido na década de 80, se for um filho dos 90 as coisas vão complicar.

Num momento de total emancipação, que só os 26 permitem, abrimos a pista sem medo, arriscamos passos de dança e vibramos a cada música que conhecemos: uma do R.E.M, uma do Joy Division, e, babe: cantamos de cor e salteado, e com muita animação uma música do Gossip. Nos sentimos tão atualizados que começamos a pular. Então nos damos conta que até nosso dance-code é démodé: os adolescentes adaptaram os passos de funk para todo e qualquer ritmo, fazendo sanduíches de si mesmos enquanto se esfregam e cantam com seus drinks na mão. É bizarro. Olhamos pra eles com ares de reprovação.

Começamos a consumir água enquanto as pessoas ainda estão chegando, afinal temos que obedecer a Lei Seca. Respeitamos direitinho a área de fumantes. Lavamos as latinahs e garrafas antes de colocarmos a boca ali. De vez em quando sentamos um pouco, sabe como é, pra descansar as pernas. Então nos agarramos à manivela do Pac-Man como se não houvesse amanhã, e fase atrás de fase devoramos bolinhas amarelas e monstros. No fim, exaustos, cedemos lugar a alguém de 18 anos que nunca nem soube o que era Nintendo.

Por milagre, nenhuma pessoa desconhecida vem nos abordar, isso seria tão patético quanto o fato de que saímos da boate à 1 e meia da madrugada. Vai ver a terceira idade se chama “melhor” idade por causa disso: você finalmente aprende a se divertir, mesmo que o final da noite seja a tela de um jogo de Atari onde se lê GAME OVER.



:: Teenage Kicks, Nouvelle Vague

domingo, fevereiro 01, 2009

When only you could be the one to win out over me*

Eu fico perdida e encantada com todas as possibilidades que você me dá, com todas as chances que você me oferece de pensar mais sobre as coisas, com todas as chances que ganho de reavaliar as relações que crio com tudo, com as pessoas, com você também. É como se a cada conversa eu tivesse tempo e lucidez para compreender melhor tantos desses questionamentos, dessas angústias e aflições que dividimos. Como se a cada divagação eu tivesse mais instrumentos e idéias para lidar com esses dias de nonsense interminável.

Fico perdida porque escarafunchamos tanto os itens dos debates e nunca nos preocupamos em concluir, de forma que acumulamos muito mais perguntas que soluções. E também porque me adoro quando estou perto de você, de um jeito tão novo e delicioso que, confesso, às vezes desligo um pouco das suas palavras para aproveitar essa sensação tão boa de gostar de mim tão plenamente.

E fico encantada porque a sua capacidade de argumentação sempre me surpreende, e isso me dá a dimensão exata do quanto ainda posso esperar de você – sensatez, humor, maturidade, em doses e momentos onde geralmente eu só esperaria decepção. E principalmente, me encanta essa sensibilidade, essa doçura, esse jeito de olhar que você consegue, essas descobertas todas que você faz, e que eu faço também, em horas de assuntos e risos que compartilhamos.

E fico absolutamente feliz quando concluo que essa felicidade é possível, e sujeita apenas à nossa vontade de ficar perto, à nossa convivência, tão essencial e redonda que segregamos pessoas em nome dessa sintonia.

Eu fico perdida e encantada com todas as possibilidades que você me dá, com todas as chances que você me oferece de entender e apreciar detalhes que provavelmente passariam despercebidos, fico boba ao constatar o quanto você sabe sobre milhares de coisas que eu sequer desconfio, o quanto você transforma tudo em poesia (sem ter idéia de que o faz), o quanto alguns episódios e sutilezas ganham dimensões tão especiais quando narradas de forma tão envolvente por você, fico envaidecida e ao mesmo tempo abençoada em perceber o quanto você me deixa à vontade para cantar aos berros a mesma música repetidamente enquanto você dirige, inventando a letra, mudando um pouco a melodia, desdenhando da companhia de todo mundo que não vai saber cantar junto.




* Basia Bulat in "Snakes and Ladders"