Para: undisclosed recipient
Assunto: Speaking words of wisdom
Data: 27 de outubro de 2010
Segunda-feira eu acordei resoluta de duas coisas: a primeira é que tinha que pintar o cabelo, não podia mais postergar o fato. A segunda é que o cabelo teria que ficar pra terça-feira pois à noite ia ao cinema ver o documentário "O Último sonho de Pina Baucsh", dentro da programação do Festival do Rio.
Pois bem. Chequei os emails de trabalho, respondi as urgências, organizei as finanças do mês e fiquei com a respiração suspensa quando li que o Morumbi reservou os dias 21 e 22 de novembro para Sir Paul McCartney. Quem mandou o link foi a Ritinha, e imediatamente trocamos 345 emails histéricos ponderando que o sobrinho não poderia, em hipótese alguma, nascer antes do tempo. A Ritinha tinha outras preocupações de cunho mais, espiritual, digamos, e toda uma logística de que os dois melhores Beatles se foram. Eu sempre fui mais fã do Paul, acho que meu segundo Beatle era o George. Tenho quase certeza de que só a minha mãe era fanática pelo Ringo. Anyway. Beatles, "Qual estilista brasileiro você é", "Quem é você em Sex and The City", "Qual David Bowie você é", o Facebook foi certeiro em todos esses testes, acho que só errou ao afirmar que eu era o Karev de Grey’s Anatomy.
Mas voltando ao X da questão: Paul em São Paulo, sobrinho nascendo no Rio e eu fiquei desesperada tentando encontrar uma solução para conseguir estar presente no parto e no show do Paul. Tudo pode dar certo se o sobrinho nascer de fato dia 23, como diz o médico, mas gente, vocês sabem como funcionam essas coisas.
Passei o dia nervosíssima, tomei um banho no fim da tarde e fui pro cinema esbaforida, coloquei o ipod no máximo e cantei Band on the Run me imaginando no meio do Morumbi com o Deus à frente. Chegando na bilheteria, não encontrei minha carteira na bolsa. Oh God, pensei, é a segunda vez que perco a carteira esse mês. Por sorte eu tinha o código de compra anotado num caderninho e consegui o ingresso. Entrei na sala, o cinema estava vazio, sentei na melhor poltrona (o Marcelo certamente aprovaria minha escolha) e re-la-xei.
Veio um mocinho avisar que a sessão atrasaria cinco minutos, eu olhei ao redor e achei o público da Pina Bausch bem esquisito e logo em seguida as luzes se apagaram. As cenas que se seguiram na tela me espantaram: Roman Polanski dando uma entrevista a um repórter que queria saber do interesse dele por mulheres mais jovens. Eu, que não freqüento festivais, pensei que os documentários estão ficando cada vez mais enigmáticos. Os depoimentos de advogados e juízes começaram a aparecer e eu ainda pensei, sei lá, vai que o último sonho de Pina Bausch era inocentar o Polanski. Ha ha, claro que eu não pensei nisso.
Peguei o ingresso, fiz lanterninha com o celular dentro da bolsa e li: “O Último sonho de Pina Bausch” dia 4 de outubro. Como eu já estava ali, fiquei até o fim controlando o riso. Eu me diverti sozinha pensando na minha trapalhada.
Entrei em casa, o telefone tocou e era meu pai. Contei pra ele a patetice do dia. A história melhora aqui: ele contou que comprou ingresso pra ver Brad Mehldau no Municipal sábado, e lá foi. Subiu as escadas do Theatro e esticou o braço com o ingresso na direção do mocinho que olhou pra ele e disse “senhor, esse show é sábado que vem”. Ele voltou pra casa também divertido. Concluímos que só pode ser genético.
Em tempos de confusão mental, minha gente, o conselho é de Sir James Paul McCartney: Let it be.