segunda-feira, setembro 27, 2010

Sent Mail

De: Julieta
Para: undisclosed recipient
Assunto: Speaking words of wisdom
Data: 27 de outubro de 2010

Segunda-feira eu acordei resoluta de duas coisas: a primeira é que tinha que pintar o cabelo, não podia mais postergar o fato. A segunda é que o cabelo teria que ficar pra terça-feira pois à noite ia ao cinema ver o documentário "O Último sonho de Pina Baucsh", dentro da programação do Festival do Rio.

Pois bem. Chequei os emails de trabalho, respondi as urgências, organizei as finanças do mês e fiquei com a respiração suspensa quando li que o Morumbi reservou os dias 21 e 22 de novembro para Sir Paul McCartney. Quem mandou o link foi a Ritinha, e imediatamente trocamos 345 emails histéricos ponderando que o sobrinho não poderia, em hipótese alguma, nascer antes do tempo. A Ritinha tinha outras preocupações de cunho mais, espiritual, digamos, e toda uma logística de que os dois melhores Beatles se foram. Eu sempre fui mais fã do Paul, acho que meu segundo Beatle era o George. Tenho quase certeza de que só a minha mãe era fanática pelo Ringo. Anyway. Beatles, "Qual estilista brasileiro você é", "Quem é você em Sex and The City", "Qual David Bowie você é", o Facebook foi certeiro em todos esses testes, acho que só errou ao afirmar que eu era o Karev de Grey’s Anatomy.

Mas voltando ao X da questão: Paul em São Paulo, sobrinho nascendo no Rio e eu fiquei desesperada tentando encontrar uma solução para conseguir estar presente no parto e no show do Paul. Tudo pode dar certo se o sobrinho nascer de fato dia 23, como diz o médico, mas gente, vocês sabem como funcionam essas coisas.

Passei o dia nervosíssima, tomei um banho no fim da tarde e fui pro cinema esbaforida, coloquei o ipod no máximo e cantei Band on the Run me imaginando no meio do Morumbi com o Deus à frente. Chegando na bilheteria, não encontrei minha carteira na bolsa. Oh God, pensei, é a segunda vez que perco a carteira esse mês. Por sorte eu tinha o código de compra anotado num caderninho e consegui o ingresso. Entrei na sala, o cinema estava vazio, sentei na melhor poltrona (o Marcelo certamente aprovaria minha escolha) e re-la-xei.

Veio um mocinho avisar que a sessão atrasaria cinco minutos, eu olhei ao redor e achei o público da Pina Bausch bem esquisito e logo em seguida as luzes se apagaram. As cenas que se seguiram na tela me espantaram: Roman Polanski dando uma entrevista a um repórter que queria saber do interesse dele por mulheres mais jovens. Eu, que não freqüento festivais, pensei que os documentários estão ficando cada vez mais enigmáticos. Os depoimentos de advogados e juízes começaram a aparecer e eu ainda pensei, sei lá, vai que o último sonho de Pina Bausch era inocentar o Polanski. Ha ha, claro que eu não pensei nisso.

Peguei o ingresso, fiz lanterninha com o celular dentro da bolsa e li: “O Último sonho de Pina Bausch” dia 4 de outubro. Como eu já estava ali, fiquei até o fim controlando o riso. Eu me diverti sozinha pensando na minha trapalhada.

Entrei em casa, o telefone tocou e era meu pai. Contei pra ele a patetice do dia. A história melhora aqui: ele contou que comprou ingresso pra ver Brad Mehldau no Municipal sábado, e lá foi. Subiu as escadas do Theatro e esticou o braço com o ingresso na direção do mocinho que olhou pra ele e disse “senhor, esse show é sábado que vem”. Ele voltou pra casa também divertido. Concluímos que só pode ser genético.

Em tempos de confusão mental, minha gente, o conselho é de Sir James Paul McCartney: Let it be.

sábado, setembro 18, 2010

Carta a T.

Chouchou,

Não é bem uma carta que te escrevo, e sim um apanhado geral das coisas que fui anotando e que deveriam ser desenvolvidas e endereçadas a você. Como você perceberá, não desenvolvi tanto quanto gostaria. É assunto demais. A gente não pode viver em cidades separadas, começo a me afogar em ideias que ficam sem escapatória. Enfim. Voilà.

“Como esquecer” dizem alguns anúncios espalhados pela cidade, tipografia branca sobre fundo preto, e aguardamos ansiosos o que vem pela frente e faço essa comparação meio ridícula de que tem gente que poderia ser classificada como um teaser que não deu certo.

Será que é normal colecionar frases do Hortifruti e morrer de rir delas toda vez que a banca da esquina se renova? Tenho colecionado palavras também, invento enormes frases só para encaixa-las e tudo vira ficção apenas pra que “contágio” ou “escandalizar” entrem na página, mas não entram porque empaco no caminho e não conto história nenhuma. Inauguro, ainda, um novo caderninho onde anoto as frases que mais gosto dos meus amigos: “domingo eu sou apaixonada por ele”, ela disse, contrariando toda a lição de vida que o Robert Smith nos ensinou durante anos de pista de dança. Sempre preferi “Just Like Heaven”. Fico vidrada quando ele começa a cantar. Numa festa imaginária, “Just Like Heaven” só pode vir antes de “This Charming Man”. Será que existe mais alguém no mundo que entenda essa lógica?

Ando misantropa até o último fio de cabelo (Carol então, nem sei!), segregando pessoas, dizendo não ao telefone, preferindo comer no meu restaurante preferido sem alguém que me conte como foi seu dia. Seriously: não poderia me interessar menos por terceiros nesse momento. Hoje era sábado, manhã e chuva quando entrei numa antiga loja de discos e só dei papo pro proprietário, que instaurou uma bela trilha sonora pro meu fim de semana sozinho. Folheei livros, CDs e cantei baixinho enquanto saboreei o fato de poder fazer tudo com calma, lentidão e sono. É incrível, e tudo o que ando desejando. Abro exceções, porém, combino um cinema e mando uma mensagem pra Bruna dizendo que eu sou inteira. Ela responde que ainda bem! e eu fico dias e horas pensando se a afirmação procede, e depende. Terças e quintas à noite eu sou tão inteira que me assusto. Sexta à tarde eu nunca sei onde estou, quiçá do que se compõem meus ossos e fibras, parece que tudo se esfarela e vira pó.

Sobre as outras coisas: com ele não posso mais, mas também não posso mais esse não poder mais. Tento ser outra pessoa pra poder ser eu quando era com ele de novo, ou pra ensaiar resgate e reinvenção, pra parar de doer, mas nada tem funcionado tanto quanto dormir. A tua lista de coisas que mudaram tua vida não me sai da cabeça, e inventario as coisas que mudaram a minha, esbarro em classificações e quando percebo estou listando categorias: filmes que mudaram minha vida, viagens, cremes de cabelo, sobremesas, estradas, ressacas, percebe como as ressacas, em sua maioria, são agentes transformadores? Essa memória seletiva que a vodca nos traz, a obrigação de esmiuçar ou a chance de esquecer por completo. Tem um sapato que mudou a minha vida, mesmo que poucas semanas depois ela tenha voltado a ficar bem igual ao que era antes. Vale? Acho que a maioria das mudanças é temporária. Ou nós é que somos.

As pessoas te olham torto quando você canta ou fala sozinha no supermercado? Você canta ou fala sozinha no supermercado? Você também tem uma vontade incontrolável de enfiar a mão no cabelo da Mayana Moura pra ter certeza de que aquilo é cabelo de verdade e não um monte de fios de plástico? Será possível todo aquele brilho, e toda aquela simetria? Outro dia ela brigou com a Carolina Dieckman na novela e ao fim estava impecável. Ando intrigada com essas coisas, tipo o cabelo da Mayana Moura, o guarda-sol do Índio da Costa, os tênis da Nike. Desconexões. Bem. Não pense que estou triste, desesperada ou submersa. Ando apática sim. Daqui a pouco passa e se não passar logo, bem, we’ll always have Jardins.

um beijo enorme!