segunda-feira, agosto 27, 2007

Pausa

Eu sei que morro de saudade de ficar um tempão no carro ouvindo música, sei que acho incrível nadar de pé de pato mas que ele me dá câimbra no pé direito. Eu sei que a caixa da Modern Sound parece a Martinália e sei que um dia na praia é tão bom quanto pavê do Amor aos Pedaços. Eu sei que é possível comer uma caixa de chocolates sozinha sem culpa e sei que os postes da cidade não são mais apagáveis. Eu sei que tem umas pessoas com as quais eu sou capaz de ficar horas conversando sobre as possíveis tatuagens que eu faria e minutos depois falamos sobre se os jovens perderam sua fé. Eu sei que o vestido novo eu só vou usar uma vez e que no meio da festa eu vou mudar de sapato. Eu sei que engulo muito sapo durante a semana e que não consigo mais dormir até meio-dia. Sei que para alguns é muito difícil dizer não e pra mim então. Eu sei que eu amei o Breu. Eu sei que eu furei com uma amiga no fim de semana e sei que a costureira não vai telefonar amanhã. Eu sei que ando sem assunto e chata, sei que eu costumava ter algumas histórias bacaninhas pra contar, enquanto não tenho fico de férias de blogue.

domingo, agosto 19, 2007

Divã

Era uma conversa sobre análise que começou durante um café, não lembro onde e nem muito bem quando, só sei que a gente fazia muito isso: tomar café e falar de análise. A gente fugia muito dela também, eu já largara a minha há tempos e ela argumentava que eu devia voltar e eu sabia que devia, mas aquele incentivo vindo dela, que faltava a análise semana sim semana também, sei lá, eu desconfiava.

E então nesse dia ela me explicou. Ela saía das sessões de terapia pronta pra enfrentar as suas maiores angústias, pronta pra defender seus desejos mais interiores e desanuviada de dúvidas que a martelavam. Ela saía do consultório de cabeça erguida e nariz em pé, quase cena de filme, o sol parece que brilhava mais, o ritmo do passo em câmera lenta, ela parava pra cheirar uma flor na feira e tocava uma música que só ela escutava. Eram momentos de intensa clareza, de um bem estar, de uma coragem, de segurança. E que duravam no máximo meia hora. E vinha tudo de novo e ela não conseguia prolongar esses minutos de clareza, eles se diluíam no dia-a-dia e tudo ficava ainda mais angustiante porque não conseguir reter esse estado era apavorante. E então de que valia?

Era como ir ao dentista, eu disse. E tive que explicar: eu saía do dentista convicta de que nunca mais beberia coca-cola ou comeria chocolate e cigarros imediatamente faziam parte de um passado remoto. Mate, chá, café, nada. Eu escovaria os dentes meticulosamente, usaria dio dental e faria bochechos de flúor todo dia. Eu sentia meus dentes tão limpos que podia até jurar que eles estavam mais claros. Isso tudo durava até o almoço.

E comecei a pensar em tantas outras, nas massagens e sessões de rpg que me faziam tão bem e eu prometia que não sentaria mais curvada, as ressacas de bebedeiras quando eu pensava repetidamente que nunca mais iria beber daquele jeito e todos esses eram momentos de clareza que funcionavam quase como resolução de ano novo. E todos, invariavelmente, duravam dez ou vinte minutos, assim como o pós-análise.

E todos, também invariavelmente, vinham depois de coisas que fazíamos ao contrário. Postura ruim no trabalho, cafés e chocolates durante o dia, besteiras e sofrimentos emocionais e tudo o mais que passava, ou parecia passar. Nisso tudo nós concordávamos. A diferença é que enquanto ela achava que a solução era conseguir prolongar os chamados “dez minutos de clareza” eu achava que o jeito era continuar errando afinal as epifanias não vinham à toa.

segunda-feira, agosto 13, 2007

Da série coisas que só acontecem comigo:

Eu achei que era invenção da minha cabeça fantasiosa e pra evitar polêmica e internação resolvi ficar quieta. Mas quando, horas depois, meu pai telefonou pra saber se eu tinha ido buscar o carro e se tinha gostado da "reforma" eu disse que sim, que gostara muito e que de fato o carro estava mais limpo do que nunca, e mais novo até e mais de outra cor também. Papai imediatamente concordou e logo depois acrescentou que também tinha ficado quieto porque pensou que aquilo só podia ser coisa da cabeça dele. E então conversando sobre o assunto não restavam dúvidas: a oficina me devolveu o mesmo carro pintado de outra cor.

quarta-feira, agosto 01, 2007

Já que o brilho desse olhar foi traidor

A casa nova é na montanha e é portanto o lugar mais gelado do mundo, o cachorro me mordeu feio na perna, acho que ele tentou me matar, a torta de pavê crocante é um vício, outras pessoas descobriram que os biscoitos da minha avó são os mais deliciosos do planeta, encontrar cds do Dave Mathews Band é tarefa árdua, ladrões, além de escrotos, são burros porque um sujeito em São Paulo que se disse meu avô tentou passar meus cheques, por que eles acham que os mesmos não estariam sustados depois de quase um mês???!!!, Lia Rodrigues Cia de Danças quase não me deixa dormir de perturbação, mudei todos os livros de lugar, achei aquela peça de teatro chata demais, não consigo fazer um óculos novo porque o meu era o mais lindo de todos, voltei a ser amiguinha da moça do silk, o novo corte de cabelo ficou ótimo, outro dia saí igual a um Stroke, morro de saudades do carro, andei num táxi cujo taxista era surdo e eu tinha que escrever o destino num papel, dei um tênis que eu tinha desde os 15 anos, pendurei o meu retrato na parede um pouco escondido, fui até o banheiro enrolada no cobertor porque ter que acordar às sete da manhã num frio de rachar dói, a coluna parece nova e, lei das compensações, só pode ser, o ombro esquerdo piora a cada dia, o bacana do novo corte de cabelo é que posso nadar sem touca!!!, recomecei as aulas de francês e o passé composé continua sendo um mistério, fui num bazar de lingerie e fiquei chocada ao ver mulheres ensandecidas por calcinhas e sutiãs, recebi outra mensagem evangélica no celular, ganhei um cachecol, comi waffle no café da manhã do Cafeína sozinha, tomei chocolate quente com creme depois do trabalho com uma amiga, trouxe o rádio do conserto mas esqueceram de me entregar o fio, repeti Bethânia cantando “chega de tentar dissimular e disfarçar e esconder...” ad infinitum, a cadela da minha professora de francês não se conteve de emoção e alegria quando me viu e fez tanta bagunça que sem querer comeu um pedaço do meu caderno, decorei sem querer o número do telefone da facção que faz nossas camisolas, da fábrica que faz nossas calcinhas e do Leve Fácil, terminei um livro que entrou na minha top 5 list, uma amiga reparou que sei bem as regras de crase, dessa vez não vou perder o Momix, fiquei tentando adivinhar quem era a Juliana do Grupo Corpo na capa do Segundo Caderno de algum dia da semana passada, fiquei muito feliz de pensar que vou poder comprar meu cd Lecuona de novo!, dei uma chance ao corretivo de O Boticário, tomei um Miosan e fiquei completamente lesada, habitei uma cidade paralela onde não havia jogos do Pan, descobri que faz meses que não vejo nada na televisão, levei a sapatilha na mochila mas na hora h não fui fazer a aula de ballet, fiquei bêbada sem querer, fiquei com saudade sem querer também e fiz um monte de outras coisas sem querer, olha o perigo, tietei os amigos, recebi vários convites todos muito interessantes para a mesma data, é claro, comprei um livro porque gostei da capa e do título, resolvi que coisas que a gente não sabe se gosta são muito melhores que algumas outras que a gente tem certeza, dormi com muitas e muitas roupas e alguns cobertores por cima e deve ser por isso que não me lembro de nenhum sonho.