O dia da faxina é segunda-feira: a sua é a história de
amor mais triste de todas, ela disse, entre uma colherada de canja de galinha e
outra, e eu pensei que 90% do tempo que estou viva e consciente (acordada)
consigo não pensar nisso, mas que quando os 10% batem é como uma locomotiva que
descarrila e não sobra ninguém e a gente muda de assunto, fala de viagens,
desses destinos onde chove sem trégua, fileira de poças e lenços de papel e
aquela impressão de que os ossos ficam úmidos, as articulações ficam rangendo e
o corpo se torna esse porão com tantas camadas de lã e tecidos protegendo
móveis, joelhos que falham, quadris que deslizam um pouco para fora do lugar –
e todos esses cartões postais por escrever – e é como se andar te maltratasse a
ponto de você passar tardes cochilando num quarto de hotel, até o dia de pegar
um trem, desembarcar numa plantação de cravos and so all else above sonhar que
todo ano essa volta seria possível, esses dias em língua estrangeira e
schnitzel em excesso, todo o tempo do mundo para observar vitrais em catedrais
góticas, e esse domingo ameno feito de papel de presente e embrulhos coloridos,
piadas e mapas pra colocar em dia, esse domingo adiando a constatação de que a
poeira está sempre ali, à espreita, basta arrastar o sofá.