Não consigo escrever de cabelo solto, nem com muita roupa.
Bebo água e me levanto da cadeira em doses cavalares. Não tem nada a ver com as
recomendações do fisioterapeuta. Escuto uma mesma música como se fosse maníaca,
e não encontro caminhos pro texto até que uma melodia ou letra soe certa e me
coloque no rastro de alguma coisa que funcione. Debussy, um reggae ou aquela
música do Velvet. Depois de alguns parágrafos, começo a sentir um frio terrível.
sábado, setembro 15, 2018
quinta-feira, setembro 13, 2018
Jardins
Ela me perguntou se
quando escrevi aquele diário eu já sabia que um dia ele serviria como
matéria-prima de ficção. Eu disse que sim. Não que eu soubesse, exatamente, mas
já intuía. Algumas coisas são tão óbvias. No início eu escrevia porque estava
convencida de que vivia algo extraordinário. Hoje me parece claro que era eu –
o meu esforço em tornar tudo aquilo extraordinário, mais que isso: o meu desejo
de que aquilo fosse extraordinário – que tornava a história digna de nota,
afinal aquela história era rigorosamente igual às outras tantas da mesma
categoria. O diário era uma armadilha. E o pior é que continuou sendo. Tantos
anos depois, voltar àquelas páginas, impregnadas de uma pieguice sem tamanho,
uma cafonice absoluta. Um constrangimento, em suma. Ela sugeriu, então, um
texto de Blanchot sobre diários. “Escrevemos para salvar os dias, mas confiamos
sua salvação à escrita, que altera o dia.” Gosto cada vez mais de P., por todas
as suas inúmeras características tão gostáveis, e uma delas é essa, a de ter sempre
um texto relacionável na manga, o que procrastina qualquer intenção, de minha
parte, de atacar a minha própria página, a minha vontade de reescrever aquela
história, de tentar salvar alguma coisa daqueles dias que ruíram, como é
próprio da categoria a que desde o começo estavam fadados, e que agora ruem de
novo.
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