segunda-feira, junho 16, 2014

Porto Alegre - vol. 3

Querida,

Foi só quando abri a terceira caixa que encontrei o meu bloco meio amassado – e ainda não sei onde foi parar o caderno de receitas, não consigo achar – com o começo de um bilhetinho que ficou inacabado. Eu pensava que aproveitaria a calmaria do Horto para escrever, estudar e começar uma horta. Mas a vida prática se impõe e eu já acho que a qualquer momento um vizinho vai bater na minha porta pedindo encarecidamente para que eu pare de passar aspirador a todo momento: é tanto silêncio que o menor ruído torna-se agressivo.

Meus ombros doem como se eu tivesse nadado quilômetros: sinto falta daquela piscina, de passar pela praia todo dia e de algumas pessoas que ficaram pra trás. E do cachorro: morro de saudades do cachorro, e toda visita que faço a ele é só uma confirmação de que cada vez terei menos dele, e isso me dilacera, acabo sempre chorando no elevador.

Tem sido difícil trabalhar ou gostar de qualquer coisa que não ficar em casa e outro dia mesmo pensei em simular um desmaio ou pedir demissão: pintar uma mesinha, comprar mais flores para encher as garrafas de espumante que ficaram, provar todas as frutas da minha feira delivery e mais uma vez tentar aparafusar as estantes (tem uma foto no jornal de um escritor na frente de suas estantes, iguais às minhas, mas todas retas, e eu me pergunto como? J. acha que elas estão empenadas.). Ou, sei lá, ver um jogo de futebol esparramada no chão da sala, devorar brigadeiros.


É bom ter você de volta e poder fazer um pouco de tudo isso juntas. Fique por aqui. 


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