terça-feira, dezembro 22, 2009

Come rain or come shine

(da série "coisas que ajudam a viver", ano 2009)

As coisas inusitadas que aparecem eventualmente numa mesa do Baixo Gávea, e que variam desde um bolo de chocolate ainda no tabuleiro até clémentines deliciosas vindas diretamente de Paris. Quarteirão com queijo especial. Todos os brigadeiros de muitos milhões de reais que podem ser devorados ao lado da Pizzaria Guanabara. A ansiedade de buscar o negativo revelado na loja de fotos, e poder conversar com o vendedor sobre os filmes, mesmo que você não tenha o mais vago conhecimento sobre o assunto. O Jobi e o Diagonal, dois bares para os quais nunca se deve dizer não.

O Grupo Corpo, mesmo quando não é incrível, mesmo quando é longe pacas, mesmo quando não acontece tanta mágica. Bruno Cesário e Joaquim Tomé quando dançam juntos de preto. O Tony, quando gargalha dando aula e me diz para atacar mais. O Toni com "i", quando me pega no colo. O celular quando apita mensagens contendo a palavra “tigresa”.

Todos os livros que eu posso ler, mesmo os ruins, mesmo os que não permanecem, mas especialmente os que me dão vontade de querer alguma coisa. Os quadrinhos de Peanuts, e poder envia-los por email. Os emails de madrugada que nos servem de confessionário para vergonhas escondidas. As conversas salvas de msn que posso colar no caderno como lembrança. Belle and Sebastian, sushi e sashimi. Uma credencial que guarda as emoções de um desfile de inverno, o livro de Ronaldo Fraga na estante. Assistir a um pedacinho do José Luis Peixoto na TV, sem querer. Passar o dia na piscina a devorar torradinhas com pasta e saber que isso é felicidade quando os amigos estão juntos.

Dar asas à insegurança no Tok & Stok. Ou na Zara. Ou no Hortifruti. Ou no Zona Sul. O almoço do dia primeiro de janeiro, sempre. Os dias em Angra que chegam por acaso, e as marolas da lancha parada em frente à praia. As noites de conversas infinitas adoçadas por biscoitos de avó num cafofo. O carpaccio do Gula Gula. As livrarias e os cafés dentro delas, e essas coisas bobas que viram elos: lanches, poesia, chocolate quente com creme.

A Casa da Matriz. O karaokê indie, mesmo quando não se consegue cantar Smiths no palco. Smiths, a banda que sempre salva a minha vida. O John Lennon quando canta. “While my guitar gently weeps” a todo volume no percurso Ipanema-Leblon de madrugada. Entender que “boboca” combina muito com “eu te adoro”, ou vice-versa. Ilhas gregas, com ou sem queijo feta. Um apartamento especial cheio de post-its na Rue de Rennes. O Calder no Pompidou. “A Última Ceia” em Milão. Os jardins repletos de risinhos infantis e gente a desenhar. As lingeries da La Perla. Os croissants da França, que são melhores que qualquer outro alimento do mundo. A alegria de avistar uma placa onde se lê “Underground”. Veneza quando chove.

Flertes via mensagem de celular. Ouvir Karma Police na Apoteose cheia e emocionada em frente ao Radiohead (for a minute there I lost myself, I lost myself). Acordar no dia seguinte do show do Radiohead e descobrir que a coluna não dói mais. Adorar a praticidade de enviar pro oftalmologista por email uma foto do olho cheio de gosma de manhã. Adorar a praticidade de desligar o telefone às vezes. Ir à praia com o ipod, e entender que ele serve pra essas coisas. O cachorro quando eu chego em casa, e quando ele brinca tão alegre que nem me importam as almofadas que vão caindo pelo chão. O cachorro quando eu estou triste, porque ele nunca piora as coisas. O cachorro quando eu estou feliz, porque ele sabe.

Um amigo que me deixa chorar, seja na mesa cheia de waffles ou no carro com abraço e colo.

Amigos que dançam quadrilha na sala do apartamento de um deles, amigos que dançam dentro de uma piscina esvaziada, amigos que não deixam a festa acabar (mesmo que para isso seja preciso ir a uma praia distante no frio), amigos que hipotetizam sobre ménage-à-trois.

O Ney Matogrosso no palco. As homenagens ao Michael Jackson. A Pina Bausch no filme do Almodóvar. As tardes na praia com vergonha da câmera apontada pra mim. Acreditar em horóscopo numa manhã de domingo. Inventar a pior cantada do mundo e ver que mesmo assim ela funciona.

Cazuza.

Aquela cama enorme cheia de travesseiros. Lecuona. As linhas 12, 13 e 14 da página 31 de “Cemitério de Pianos”. “O Estrangeiro” na língua original. Beijo no (meu) pescoço, mesmo quando acidental. As gravuras restauradas na parede. Dormir 12 horas seguidas, e sopa no inverno. Dramin, às vezes. Woody Allen esparramada num colchão pra 3 nos Jardins. Peças infantis com toda a criançada encantada na platéia. O Rei sob dilúvio. #41, do Dave Mathews Band. Vinícius de Moraes. Furtar catálogos de exposições em SP. Bolinhas-de-queijo. A lotação da praia e as piadas decorrentes, e quando a prima guardava lugar pra gente que chegava depois. Miss You, do Rolling Stones. A carta do Carlos. A carta da Bruna. A irmã no quarto ao lado. E, por que não, até mesmo o Zoológico. Fernanda Montenegro quando é Simone de Beauvoir. Sangria. The Rain Song, do Led Zeppelin. Cachorro quente feito pela Carol. E, confesso, Kid Abelha em dias nublados.

Palavras que começam com “des” – desamparo, descaminho, desmesura, desalento. Tudo o que vem depois que imito Marina Lima. Sessão da tarde, mesmo fora de época. Bombons. Yogoberry com manga. Grampos de cabelo, Grey’s Anatomy e a Lindomar quando me chama de “minha menininha”. A charutaria na Rua Senhor dos Passos. O Real Gabinete Português de Leitura e os sebos ali perto. Babilaques.

Sophia de Mello Breyner Andresen. Noites em que o melhor momento é quando o A-Ha canta Crying in the rain numa rádio duvidosa do carro e isso não significa que tudo foi ruim. Saber cantar Crying in the rain ainda de cór. Mergulho na praia da Reserva, onde ainda há conchinhas, depois de sessão de massagem com a Ana. Massagem da Ana. Ficar indie aos domingos. Colírios e uma gripe pra parar um pouco. O Bolero de Ravel. Tin tin e Capitão Haddock. E Milou, é claro. Saber a hora de sair. Começar tudo de novo. Acreditar quando a Globo canta que hoje a festa é sua, hoje a festa é nossa, é de quem quiser. Levar sustos com presépios. Aprender a respirar.

Escrever um blog!

quinta-feira, dezembro 17, 2009

The "porteiro da noite" issue - vol 2.

Desde que a portaria do prédio entrou em obras que um sofá passou a habitar a garagem, e portanto, sempre esbarro o carro nele. Eu me sentia bastante idiota até perceber que bater o automóvel no sofá apodrecido servia para algo sensacional: acordar o porteiro da noite.

Eu havia dado um desconto na minha implicância com o porteiro da noite porque fazia um tempo ele vinha me chamando pelo diminutivo do meu nome, e era mesmo fofo. Porém tive de voltar atrás quando, numa noite de céu desabotoado, fiquei ao relento.

Funciona assim: com a portaria em obras só há uma entrada possível, a garagem. E com o porteiro da noite dormindo profundamente na madrugada, só há uma alternativa: possuir um controle eletrônico que abra o portão da garagem. Uma vez que o veículo se encontrava indoors, pronto: não houve interfone que acordasse o porteiro da noite, e quase não haveria remédio suficiente para a gripe de uma noite dormida na calçada não fosse uma breve internação no hospital mais próximo.

Curada a pneumonia, me vi diante do impasse: denunciar o porteiro da noite e execrá-lo em praça pública, ou melhor, em reunião de condomínio, ou conseguir medicamentos pesados e ilegais (quiçá uma máquina de café Nespresso) para manter o homem acordado.

Enquanto não tomo a decisão acertada, confesso, fantasio com uma noite abafada, dessas em que gota alguma se aventura por aqui, dessas em que o calor altera qualquer estado de consciência, dessas em que a pessoa, tomada por um suor que faz grudar a camiseta nas costas, enfia o carro sem pestanejar no sofá e o diagnóstico do seguro é taxativo: perda total.

terça-feira, dezembro 15, 2009

The end.

Dá sempre vontade de vomitar depois de tanto choro, e toda vez que eu vou embora é assim: um abraço estreito, a gente mistura risada com agonia e aborta flores. As tripas se reviram, a barriga dá revertério e me consolo porque sei que um dia volto.

Fico minguada por uma semana, de luto, só visto calças e tênis escuros, nenhuma renda pra amenizar. Então um dia faz sol, visto sedas de novo e retomo meu lugar.

Mas agora não: esta é a última vez que te abandono, daqui sigo pra tão longe que não haja bilhete de volta, cheiro de lavanda, estampa de flor. Esta é a última vez que te abandono, porque pensei muito e não posso continuar te abandonando, não quero mais me suicidar.