domingo, setembro 16, 2007

Pois já vai terminando o verão

Era tão óbvio que não resistiria a ele que pra não fazer desfeita ao acaso obedeceu. E se de primeira não detectou seus encantos, de mais duas ou três olhadas ela cedeu por completo. Ele lhe parecia tão absurdamente adorável que passou batida pelos clichês mais gritantes e percorreu com aguçada voracidade seus atrativos mais lógicos, a franja caída sobre os olhos, os rodopios na pista e um pedaço de sua saia ficava sempre enroscado na perna esquerda dele. E no fim da noite já tanto querendo o convite e num piscar de olhos já era manhã de agosto, já era ressaca de festa e já era um roçar de mãos, um roer de unhas, um cantar Cartola pela tarde adentro. E dançar.

E era tão óbvio que se apaixonaria por ele que sem haver jeito de acontecer o contrário cumpriu distraidamente o papel.

Ele lhe parecia então tão completamente aceitável em todos os detalhes. E era irritantemente encantador com seus galanteios e os sapatos que largava no meio do caminho enquanto ia falando e falando e sempre usava os adjetivos que ela nunca conseguia encaixar e quando então com resquícios de vinho na saliva se esqueciam na rede e ele alisava suas costas e entrelaçavam as mãos num enredamento de corpos até quase. E levados por um gostar. E música. Ele contava as idéias e usava pausas, ela já tanto querendo que ele quisesse também e ele lhe parecia que se movia num ritmo que era o dela também e tinham tantos motivos pra rir que às vezes gargalhavam. Ele tinha todo o charme que ela julgava ser impossível. E inverno, ele tinha cheiro de inverno. E gosto também. E tudo nele lembrava lareira acesa e manta nos pés, fogo crepitando. E lã. E nesse casulo de si mesmos, bêbados um do outro, embalados pelo frio que vinha pela janela e pelo leve balançar da rede, sem sequer saber, se despediam.

Era tão certo que viriam outros com seus outonos, suas flores de primavera e verões ensolarados cheios de suor, era tão óbvio que viriam outros com seus dias amenos e chuvas mansas ou frios piedosos. Era tão óbvio que os outros não fariam diferença que sem haver jeito de ser o contrário guardou a rede até que voltasse a nevar.

8 comentários:

Anah disse...

adoro as frases sem fim explícito. E entrei na onda dos dois, parece até um dos casos que.
Urge um encontro nosso, tenho um monte de coisa para falar e ouvir de vc!
saudades,
ana.

JULIANA disse...

Documentário "Grupo Corpo 30 anos - Uma família Brasileira" no Festival do Rio, Cine Odeon, domingo 23, 17:00.
Achei que vc ia gostar de saber!

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

Julieta, desculpe me intrometer, mas vc comprou o tal DVD do documentário que a Juliana falou? Porque ela não conta nada pra gente aqui sabe, em BH... Beijos!

JULIANA disse...

A gente deve se encontrar então.

Anônimo disse...

Me remeteu a um post antigo, que amo de paix�o!
Se acaso o irremedi�vel fosse t�o generoso como voc� sugere seria at�.

JULIANA disse...

feeling...rs...

JULIANA disse...

que pena... mas tava meio confuso no final, odeio esse clima social após a sessão