É tão fácil fantasiar sobre os mundos desconhecidos que uma vez dentro deles a decepção é quase inevitável. Eu sempre associei um fórum de direito, por exemplo, a pessoas elegantes com suas pastas de couro e ar sério, barulho de saltos ritmados pelos corredores amplos, homens e mulheres com imensos copos de café, réus e acusadores, ou melhor, autores, roendo unhas e sendo orientados aos cochichos por seus advogados e representantes legais vestindo ternos de corte impecável e organização invejável. Eu imaginava termos jurídicos e álibis, testemunhas sendo protegidas por agentes parrudos e trocas de olhares fulminantes entre as partes envolvidas de um processo. Fórum e advogados eram, na minha cabeça de criativo, lugar e seres superiores e intimidadores, tão rebuscados e bem sucedidos que eram praticamente inatingíveis. Era de se desconfiar visto que até hoje nenhum dos pintores que conheço usa boina, eu não tenho no escritório uma mesa-prancheta cheia de lápis Stabilo e certamente os plantonistas do Lourenço Jorge não lembram em nada o Dr Carter.
Poucas horas no fórum do Centro da Cidade são suficientes para nos dar a exata noção do quanto, na prática, a lei mais popular ainda é a de Murphy. Os fatos: a juíza chegou hora e meia atrasada e errou a ata ou o qualquer que seja o nome do papel que os advogados e réu e autor tiveram de assinar ao fim da não-audiência, isso tudo porque a mesma juíza ou talvez o advogado do autor, provavelmente cometeu um erro e a audiência foi remarcada; os corredores amplos são mal iluminados e carecem de cadeiras, que por suas vezes seriam reprovadas em quaisquer testes de ergonomia; os homens e mulheres da lei provavelmente nunca folhearam uma revista de moda e certamente desconhecem a palavra Armani; vendedores ambulantes transitam por toda a parte anunciando mate, refrigerante, sanduíche, o que confere certo clima de botequim/praia ao local; toda essa gente, sob a péssima iluminação, tem as costuras repuxadas de sua indumentária realçadas; não há cochichos, não há testemunhas em perigo, não há nada que lembre nem de longe todo o clima hollywoodiano e não há pessoa que possa me convencer de que advocacia e felicidade possam ser conjugados juntos, ao menos não dentro daquele prédio uó. Essas poucas horas desmistificaram por completo toda a imagem que eu tinha do povo do direito e as qualidades heróicas e arrogantes (arrogantes chic, que fique claro) que eu achava que essa gente de terno tinha caíram por terra. Até mesmo a linguagem complexa e atraente me soou apenas complicada e até agora eu não entendi porque a tal da audiência foi adiada. Eu saí do fórum dando suspiros de decepção e chateada com tanta realidade, voltei pro meu mundinho parte satisfeita de não ser um deles e parte revoltada por não ter visto sequer um tailleur decente. A única ponta de inveja é dos salários que eu sei que nunca vou ganhar. Nada que uma promoção de calças risca de giz da Zara não cure.
6 comentários:
Depois de "O povo contra Larry Flint" fiquei também com a falsa noção de que tribunal poderia ser um lugar divertido.
Mas afinal, o que você foi fazer no fórum?
Só falta agora dizer que ninguém fica gritando "objection!" a torto e a direito. Aí a decepção vai ser demais.
Meu sonho era trabalhar em um lugar onde eu pudesse gritar "objection!" quando desse na telha. Tentei durante um tempo aqui no meu trabalho e o pessoal não entendeu.
Pois e' Julia, vc citou praticamente todos os motivos que me fizeram desistir de Direito... O carreirinha ingrata, voticonta'
beijos
é, o q a senhora foi fazer no forum????
oi!! tava do seu lado no nouvelle, mas vc tava tão concentrada que não quis falar, depois não te vi mais...
descobri que a minha amiga Carla te conhece (ela tava no show comigo) e que vc tbm é amiga do joão manuel..!!
beijos
ps- concordo com vc..o forum é o ó mesmo! mas eu juro que não ando brega por lá..hehehe
Hahahaha!
É moça...sou advogada e é isso ae mesmo...não há glamour no Forum!
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