sexta-feira, janeiro 27, 2012

Os biscoitos recheados do meu tempo

No início era o Trakinas, e a gente só tolerava esse tipo de biscoito porque não tinha lá tanto discernimento. Se a gente encarava Cheetos e Fandangos, não era um Trakinas que ia despertar nosso paladar para a sofisticação da indústria alimentícia. Trakinas de chocolate e morango eram ingeridos com a mesma devoção com que comíamos Mirabel na hora do recreio. Ou Deditos. Da seara dos salgados, o biscoitinho de queijo da Piraquê era o meu preferido, e foi só em 2011 que vim a saber que a embalagem deste e de outros produtos da mesma marca foram originalmente desenhados pela Lygia Pape. Se os Tostines vendiam mais porque eram fresquinhos (ou se eram fresquinhos porque vendiam mais -  e eu gastei muito tempo da minha vida tentando solucionar essa equação), os Piraquês vendiam bem porque eram sensacionais, e a Lygia Pape certamente não tinha nada a ver com isso.

Consta em alguma parte das minhas memórias afetivas que os biscoitos São Luís também tinham seu lugar na merendeira, mas confesso que deles, basicamente, só lembro do jingle: "São Luís Nestlé, qualidade em biscooooitos!" O jingle do Passatempo, por sua vez, poderia ter-nos feito desistir pra todo o sempre de engulir tal massa. Mas o gosto e a nostalgia prevaleceram, e volta e meia compro um pacote de Passatempo recheado no camelô da esquina, só pra voltar a ser criança durante 7 ou 8 mordidas num dia qualquer às 4 da tarde.

Depois de tantos preâmbulos, cheguemos, pois, ao ponto: oOreo, o Negresco e o Bono, ou o que correponderia ao “The good, the bad and the ugly” na gôndola do supermercado.

O Oreo é certamente o único biscoito que faz frente aos biscoitos da minha avó, que já receberam excessivas loas neste blogue. A crocância do Oreo, a cor, o sabor, a brancura do recheio, tudo numa rodelinha de Oreo demonstra a que ponto a humanidade pode se aperfeiçoar e provocar o deleite alheio. Empanturrar-se de açúcar e gorduras trans nunca foi tão justificado quanto quando havia Oreo. Quando estávamos convencidos de que nada podia ser mais alentador que o Oreo, eis que surge o Oreo banhado.

O Oreo banhado, confesso, despertou o egoísmo e a ganância de muitos, afinal, a caixa continha apenas seis bolachas, todas envoltas numa capa de chocolate. Estava aí: o sublime. Nem cinema, nem literatura, nem Chopin, nem religião. Oreos banhados.

Quando os Oreos sumiram dessa terra tropical, meu mundo caiu. Eu, que a essa altura já sofria de abstinência das bolinhas de queijo, tive que encarar mais um luto comestível. E tal qual se dava nos bares, onde eu tentava decifrar a poesia de um bolinho de bacalhau, eu buscava em Negrescos e Bonos a felicidade que nenhum dos dois me daria. Eventualmente recorria ao Chocookie de baunilha, que não tinha nada a ver com a história, mas que passou a ser a melhor opção na tentativa de preencher o buraco do Oreo, que, cá entre nós, passou a ser existencial. O mundo nunca fez muito sentido pra mim. Tudo ficava ainda mais abstrato diante de absurdos como a extinção do Oreo.

O tema Oreo virou quase um tabu para mim. Era melhor não falar sobre o assunto, era melhor não pensar sobre isso, e em hipótese alguma discutir com alguém o sumiço do biscoito. Mas a verdade um dia vem à tona, especialmente quando impulsionada por cerveja, e foi numa mesa de bar (sem bolinhas de queijo), no apagar das luzes de 2011, que confessei a uns e outros a minha dor. Para meu espanto, a solidariedade e a revolta foram instantâneos: eu não estava sozinha.

Naquele dia, voltamos pra casa e descobrimos que a Amazon vendia: Oreo, Oreo banhado, colar com pingente de Oreo. Obviamente, eles não faziam esse tipo de entregas no Brasil. Desolés, seguimos nossas vidas, pulamos sete ondas, conhecemos o Japão, a floresta da Tijuca, o mercado de peixe de Niterói e eis que o Thiago anuncia, via email: habemus Oreo banhado. O Thiago estava voltando da Argentina, terra de Ricardo Darín, Fito Paez e Evita. Terra de gente que pode ler Borges degustando Oreos banhados. Terra de vinhos onde se pode ter mullets e Oreos banhados.

Enquanto o Thiago não voltou ao Brasil são e salvo e com os Oreos banhados intactos na mala, a Bibs e eu mal pudemos dormir. A gente abusou do Olcadil, teve dor de barriga, tremedeira, bebeu, fumou etc. Então, na mesma semana que confirmaram os shows do Morrissey no Rio, os Oreos banhados aportaram no Leblon, e mais não digo, porque o que se seguiu à abertura das caixas de Oreos banhados é impróprio.

Não deu nem tempo de preparar uma trilha sonora adequada, mas eu diria que o hit do momento traduz com exatidão o nosso sentimento no segundo em que, depois de um brinde, e depois de anos de delirium tremens, nossas bocas abocanharam um Oreo banhado: nossa, nossa, assim você me mata.

4 comentários:

Rachel disse...

Julinha, o Oreo que me desculpe, mas os biscoitinhos da sua avó são MUUUITO melhores!!

Eugenia Ribas Vieira disse...

ju, eu adorava o trakinas de morango. os biscoitos para mim, ficaram na infância. porém, de vez em quando, volto para lá.
lindo o seu post.
gê.

Rita disse...

Mon Dieu, alguém te deu os biscoitos dos deuses antes de mim????

Dito isso:
1. adorava Trakinas de chocolate. Há anos que não como, mas comeria agora pra voltar a ser criança durante 7 ou 8 mordidas.
2. chocookie de baunilha rules! Esse tb sumiu do Zona Sul faz tempo, não?
3. Sensacionais revivals de jingles e slogans!

Julieta disse...

Rit, fica fria, chocookie tem até em Barra Grande, um lugarzinho que fica perto daquela praia na Bahia cujo nome não posso dizer!

Vai lá no Zona Sul que tem!