sexta-feira, setembro 27, 2013

Assum branco - vol. III

Que dias há que n’alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como, e dói não sei por quê.


Camões

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Identifico-me ao porteiro, que trata logo de abrasileirar as coisas, e assim entro em casa de Manu. De repente é muita gente com o mesmo nome nos meus dias, e eu penso se isso é evidência de alguma coisa: pretexto, horóscopo ou um destino inescapável – cancelar o inverno alemão e ir ler Pessoa à beira-mar.

Mas ainda é quinta-feira, Manu tem um sotaque francês que eu adoro, uma habilidade para fazer coisas – tranças, cartões, cadernos – e talvez seja o mês, o horóscopo ou um pretexto: tem sido muito difícil não gostar das pessoas, de pisos de taco, das calçadas do Flamengo.

Na janela L. e eu falamos de encontros – ainda que pela metade – e trocamos um daqueles abraços que só mesmo na primavera, e  agora parece-me impossível narrar isto que ainda se dá em algum lugar de nossas barrigas e ressacas, porque Manu faz de suas delicadezas carimbos – reais e metafóricos – e eu não tenho preparo emocional para tanto: uma poção mágica da Mongólia; um foie gras feito pela avó já falecida, armazenado em pote datado; a foto da avó, de negro, imponente; hortelã com rum em copos de geleia com enfeite artesanal feito com a mão dela – e penso nos copos do Pedro e quero ter uma casa toda assim, com objetos transformados, coisas que eram outras, interferências – conquistar um território.


E toda aquela revoada de pássaros espalhada por ali, ou nuvens, porque tem sempre alguma coisa que voa em dias assim. 




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